domingo, 28 de fevereiro de 2010

Guarda-o-quê

Tenho certeza de uma coisa. Não sou só eu que não gosto dele.
Você também não gosta. Sua irmã não gosta seu irmão também não. Seus vizinhos, seus amigos, seus colegas. Até seu pai e sua mãe não gostam. E não é de agora. Na época da sua avó já era assim. Ela também não gostava. Mas por falta de coisa melhor, todo mundo usa.


Basta um pingo pra todo mundo lembrar que ele existe. Basta o segundo pra ficar apavorado se esqueceu em casa ou no carro. Principalmente as mulheres que não gostam dos fios de cabelos eriçados. Mas basta abrir pra também começar a reclamação - que junto das gotas vem o vento e que então as gotas não vêm somente de cima, vêm de lado, e então logo se conclui que a coisa não resolve o problema e pronto.

Sim, o guarda-chuva é a invenção mais paradoxal de todos os tempos. Porque só ele consegue ser ao mesmo tempo a pior das invenções e a que vende como água!

Depois de meses e meses procurando uma brilhante ideia, uma ideia realmente genial para investir neste milênio alguns trocados que consegui poupar no passado, eis que tive esse insight arrebatador. Vejam só.

Hoje em dia não sou comerciante nem nada, mas diante das mudanças climáticas em que as grandes previsões globais não são nada mais nada menos que chuvas torrenciais e temperaturas de não se conseguir andar nem debaixo da sombra, não me resta a menor dúvida de que num futuro próximo venderei
um só artigo: guarda-chuvas.
Obviamente, servirá tanto para os dias escaldantes, de muito sol, quanto para os dias de águas abundantes. Só me resta contar com os avançados recursos tecnológicos a favor de um produto realmente eficaz. Um produto que definitamente cumpra cem por cento seus objetivos de não molhar nem queimar partes do corpo. Para seres tão superiores capazes de inventar chips adaptáveis em humanos, não me parece nenhuma missão impossível.

Mas o que eu tenho mesmo são sérias dúvidas quanto ao nome.
Como o objeto revolucionário em questão será utilizado tanto como sombrinha quanto como guarda-chuva, acho que teria que ter um terceiro nome. Deixe-me ver....ah... já sei, talvez... guarda-tempo!

Sim, guarda-tempo talvez seja um ótimo nome, até porque tempo, além de estado climático, também está sendo considerado sinônimo de “artigo raro” inclusive no Aurélio!
Portanto, resolvido: guarda-tempo. Um nome cheio de significados e glamour!
Um nome onipotente e onipresente. Um nome cujo conceito transmite altíssimo luxo e simpatia. Utilíssissimo para a sociedade! Artigo de primeira necessidade! Altamente acessível e democrático! Ecológico e auto-sustentável...
...Só um pequeno parenteses ...como estamos em ano de eleições, alguém aí se habilita a algum patrocíniozinho?... ainda temos um espaçozinho no cabo...nada tão caro assim, preço de dois guarda-chuvinhas daqueles de camelô. E aí, negócio da China, né, não?!

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Ponto Cruz

Quando era pequena eu sonhava em ser professora. Montei duas cadeiras em casa, no salão dos fundos. Comprei uma cartilha para marcar presença das duas alunas, minha avó e a moça que trabalhava como doméstica em casa. Também marcava pontos positivos e negativos na cartilha. Principalmente os últimos. Adorava!
Comprei uma régua, das grandes. Tinha cinqüenta centímetros. Não, não era para dar aulas de desenho. Era para ameaçar minhas alunas caso elas não se comportassem. Copiava mais ou menos o que vivia em classe aos sete anos de idade.

A vida me levou. Ou eu levei a vida, não sei. Só sei que me formei em comunicação, não em pedagogia. Mas de uma forma ou de outra acabei me tornando professora... quando me tornei mãe. E, ao contrário de antigamente, hoje em dia eu vejo claramente que há opções de como ser mãe. A gente pode escolher como quer exercer essa, digamos, função.

Vou explicar melhor. Percebo que nós mulheres podemos gerar um filho, mas podemos não exercer a função de mãe como profissão. Podemos delegar isso a alguém, se preferirmos. Não estou aqui nem questionando se isso é certo ou errado, só estou dizendo que é possível.

A outra possibilidade é gerarmos um filho e assumirmos, entre outras, a profissão de professora, ou seja, a função de educar essa criança para a vida. A tarefa não é fácil. É árdua. Porque a mãe que opta por educar não delega, por exemplo, esse papel para os educadores da escola. Ela deseja somar e não subtrair suas responsabilidades. Essa mãe também dificilmente um dia irá à escola de seu filho desautorizar um professor na frente do filho ou dos demais alunos. Muito menos ditar regras para a direção da escola devido às cifras que deposita nas contas da mesma.

Uma mãe-professora admira, respeita e reconhece o trabalho artesanal de um professor.

Sabe que um ponto-cruz frouxo é apenas um, mas acaba aparecendo mais pra frente em toda a trama. E qual mãe não quer tecer o melhor caminho para o filho? Talvez até as que só mais tarde se deem conta de que ter sido professora poderia não ser algo tão ruim assim.